2007-09-25

Retenção de alunos com Dificuldades de Aprendizagem Específias

Por: Luís de Miranda Correia (*)
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Tenho repetido variadíssimas vezes, ao longo de vários anos, que as políticas educativas adoptadas pelos sucessivos governos não têm servido os interesses dos alunos com necessidades educativas especiais (NEE), designada e principalmente dos alunos com dificuldades de aprendizagem específicas (DAE). Estes, apesar das várias desordens neurológicas que possam apresentar e que podem afectar severamente o seu processamento de informação, vindo a originar problemas académicos graves nas áreas da leitura, da escrita e/ou da Matemática, e mesmo socioemocinais, estão dotados a um abandono tal, em termos de respostas educativas eficazes, que a escola geralmente só encontra como solução uma resposta: a retenção.

É precisamente sobre a retenção que hoje pretendo falar, mais no âmbito dos alunos com DAE tão repetidamente retidos, alvo de sucessivos maus-tratos académicos, que, na maioria dos casos, só encontram uma solução face a uma tremenda incompreensão por parte do sistema educativo, o abandono escolar, que, para muitos deles, irá significar toxicodependência, delinquência, desemprego e até prisão.

A retenção, na minha óptica, nunca foi a solução, pois, na maioria dos casos, só traz consigo consequências negativas, lesivas tantas vezes dos interesses e direitos dos alunos. De entre uma vasta gama de consequências, posso citar:

- o sentimento de insucesso e, no caso dos alunos com DAE (com inteligências na média ou acima da média), de punição que uma retenção traz consigo;

- o stress contínuo que o aluno experimenta ao ter de conviver com colegas mais novos, mais imaturos fisicamente, não compreendendo porque não acompanhou os seus colegas que passaram para o ano seguinte;

- a repetição de muitas das mesmas tarefas académicas, colocando-o, tantas vezes, numa situação de aborrecimento constante, de tédio permanente; e

- a diminuição da sua auto-estima.

Estas são algumas das consequências que a investigação incessantemente refere, confirmadas por um estudo recente, efectuado pela doutora Helen McGrath, da Universidade de Deakin, Austrália, que, depois de analisar dezenas de estudos publicados sobre a matéria nos últimos 75 anos, nos EUA e na Austrália, chegou à conclusão que eles não confirmavam a hipótese, bem aceite por muitos professores e pais, de que ao reter-se um aluno ele viria a ter mais sucesso escolar. Pelo contrário, os estudos confirmavam que os alunos retidos apresentavam uma muito maior percentagem de abandono escolar, com 20 a 50% destes alunos a abandonarem a escola.
Claro que promover o aluno com DAE para o ano seguinte não será, talvez, a solução ideal, caso não se verifique um conjunto de pressupostos para os quais, ao longo de vários anos, tenho vindo a chamar a atenção.

De entre eles, destaco, uma vez mais, a clarificação do conceito de DAE, a identificação precoce destes alunos e consequente elaboração de programações educativas consentâneas com as suas necessidades, apoiadas por ajustamentos e/ou adaptações curriculares apropriadas e consumadas por intervenções adequadas e a existência de recursos, serviços e apoios de educação especial.

Caso estes pressupostos, que considero alternativas muito mais eficazes para apoiar os alunos com DAE, não sejam entendidos, nem sequer experimentados de uma forma consentânea com a investigação séria, então não nos admiremos do insucesso escolar que continuamos a ter e dos maus-tratos académicos que continuamos a infligir aos alunos com DAE.
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(*) Professor Catedrático, Universidade do Minho
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Bibliografia
Correia L. M. (2006). Retenção de alunos com Dificuldades de Aprendizagem Específicas. In 2 Pontos: a revista dos professores portugueses (Outono/06, p. 44). Porto, Porto Editora.

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